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POSSIBILIDADE DE PENHORA DE SALÁRIO DO DEVEDOR QUE RECEBE ATÉ QUARENTA SALÁRIOS MÍNIMOS. MITIGAÇÃO DA NORMA.

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O Código de Processo Civil dispõe que valores até o limite de quarenta salários mínimos são impenhoráveis, tal dispositivo dá causa à espécie de ficção legal, ao conceder-lhe natureza de caráter alimentar pessoal e familiar, o que lhe torna intocável.

Contudo, o Superior Tribunal de Justiça inova ao estabelecer interpretação relativa e adequada à situação concreta da recuperação do crédito em relação a previsão de menor onerosidade ao devedor, inclusive, ponderando aplicação dos institutos jurídicos em referência, como por exemplo, situações que permitem penhora de percentual de verba salarial, desde que não prejudique a dignidade e o sustento do devedor e sua família, cuja ementa se adota e extrai-se do Informativo nº 771
25 de abril de 2023.:

“A divergência reside em definir se, na hipótese de pagamento de dívida de natureza não alimentar, a impenhorabilidade está condicionada apenas à garantia do mínimo necessário para a subsistência digna do devedor e de sua família ou se, além disso, há que ser observado o limite mínimo de 50 salários mínimos recebidos pelo devedor. ”

Referido julgamento foi acompanhado de diversos pontos importantes para o deferimento de penhora do salário abaixo de 40 salários mínimos, dos quais destaca-se:

De precedente da Corte Especial deste Superior Tribunal de Justiça (EREsp 1.518.169/DF, Rel. Ministro Humberto Martins, Rel. para acórdão Ministra Nancy Andrighi, Corte Especial, julgado em 3/10/2018, DJe 27/2/2019), é possível extrair que a exegese do dispositivo processual (art. 649, IV, do CPC/1973) deve ser orientada também pela teoria do mínimo existencial, admitindo a penhora da parcela salarial excedente ao que se pode caracterizar como notadamente alimentar. Prosseguindo e lançando o olhar sobre o critério previsto no § 2º do art. 833 do CPC/2015 - na parte alusiva às importâncias excedentes a 50 salários mínimos mensais - salientou-se o descompasso do critério legal com a realidade brasileira, a implicar na sua ineficácia.

Ao suprimir a palavra "absolutamente" no caput do art. 833, o novo Código de Processo Civil passa a tratar a impenhorabilidade como relativa, permitindo que seja atenuada à luz de um julgamento principiológico, em que o julgador, ponderando os princípios da menor onerosidade para o devedor e da efetividade da execução para o credor, conceda a tutela jurisdicional mais adequada a cada caso, em contraponto a uma aplicação rígida, linear e inflexível do conceito de impenhorabilidade. (...)

Portanto, mostra-se possível a relativização do § 2º do art. 833 do CPC/2015, de modo a se autorizar a penhora de verba salarial inferior a 50 salários mínimos, em percentual condizente com a realidade de cada caso concreto, desde que assegurado montante que garanta a dignidade do devedor e de sua família.”[1]

Bem acertada a decisão judicial em apreço que permite ao executado reduzir suas dívidas, bem como os prejuízos experimentados pelo credor, baseando na proporcionalidade e razoabilidade a possibilidade de penhorar quantia, ainda que detenha natureza salarial.

Aliás, o legislador processual, ao enquadrar valor mínimo impassível de penhora, não o proíbe, apenas, serve como orientação ao magistrado de evitar atingir quantias abaixo de quarenta salários mínimos as quais presumem-se suficientes aos gastos pessoais e a manutenção do devedor. Porém, a norma de orientação pode ser relativizada a cada caso concreto, tal como entendeu o Superior Tribunal de Justiça, para tanto, merecem preencher os requisitos abaixo estampados:

  1. Medida atípica – cabe pleitear o cabimento de penhora de verba salarial abaixo do mínimo permitido quando exauridas às medidas típicas;
  1. Evidência de recalcitrância e falta de outros bens localizados – não raras vezes o executado apresenta comportamento de ocultação, seja patrimonial ou pessoal, uma vez patente, seja esta ou aquela subtração, inaugura fundamento cabível de expor medidas mais eficazes;
  1. Verba salarial acima do padrão de vida comum – deve ser demonstrado nos autos que o valor percebido pelo devedor ultrapassa a quantia média nacional per capita, isto é, caso em que se recebe mais do que dez salários mínimos, os quais são considerados suficientes à sua subsistência e de sua família.

Em caso paradigma conduzido por esta banca, assim se decidiu[2]:

“1. A execução foi ajuizada há mais de uma década e as medidas de excussão restaram infrutíferas. A despeito disso, informa a parte exequente que o coexecutado Luiz Carlos atua como médico, além de exercer docência na Faculdade das Américas – FAM (fl. 528) e a função de Diretor do Centro Médico Pérola Bayton (fl. 524). Em razão da docência e função, aufere rendimentos líquidos de R$9.706,86 e R$11.396,50 de acordo com as informações trazidas pelo exequente. Sendo assim, esgotados todos os outros meios para satisfação da execução, e considerando a prioridade legal da penhora de dinheiro, resta justificado, em caráter excepcional, o desconto mensal incidente sobre verba alimentar, ainda que se trate crédito exequendo de natureza diversa (não-alimentar). A flexibilização da impenhorabilidade legal dos vencimentos e aposentadorias (art. 833, IV, NCPC) vem sendo admitida pela jurisprudência em casos tais, desde que fixado o desconto mensal em percentual modesto, assim contemplando-se, a um só tempo, a efetividade da execução e a subsistência da parte executada. Nessa perspectiva, afigura-se elevado o percentual pretendido (20%). (...)

Ante o exposto, defiro a penhora no percentual de 30% sobre remuneração líquida mensal percebida pela parte executada (...). ”[3]

As decisões judiciais em apreço contribuem com a ordem econômica e a diminuição de danos ocasionados aos credores, em especial, às instituições financeiras quando perseguem seus créditos em juízo. De suma relevância, adotar mais um mecanismo de alcance patrimonial do devedor que, costumeiramente, busca prevalecer de alternativas escusas ao pagamento do montante devido.

Uma vez amenizado o prejuízo do credor, o mercado terá melhor liquidez e capacidade de injetar novos recursos a título de empréstimo, capaz de fomentar a economia e de assegurar melhor tranquilidade em caso de inadimplência do devedor que caso esteja empregado e remunerado em quantia acima do padrão médio nacional, mesmo que inferior a quarenta salários mínimos, poderá ser atingido coercitivamente.

Ademais, não há se falar em prejuízo à dignidade do devedor e sua família, ao passo que o próprio Superior Tribunal de Justiça veda a penhora de cifra abaixo de quarenta salários mínimos caso o prejudique nesse sentido.

Portanto, preenchidos os requisitos que expusemos e a excepcionalidade de incidir a medida ao caso concreto, razões não subsistem ao indeferimento da medida, que, encontra-se abarcada no âmbito do Superior Tribunal de Justiça e deve, assim, por segurança jurídica das decisões judiciais, bem como da uniformização jurisprudencial, ser seguida pelos tribunais pátrios.

Por: Ciro Mazei - Advogado CMMM

 


[1] EREsp 1.874.222-DF, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Corte Especial, por maioria, julgado em 19/4/2023.

[2] TJSP – 5ª Vara Cível Fórum Central São Paulo - 0059818-54.2012.8.26.0100

[3] https://esaj.tjsp.jus.br/pastadigital/abrirPastaProcessoDigital.do?instanciaProcesso=pg&nuProcesso=0059818-54.2012/sp

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